O Objetivo do Blog

quarta-feira, 21 de maio de 2014

Limites

     A  palavra “limite” tem sido utilizada com muita frequência, nos  diálogos que envolvem  crianças e jovens.  É empregada  de forma “queixosa”.   É comum ouvirmos  exclamações do tipo:  “- Nossa! essas crianças não têm limites!”. Ou então, com um quê de autoritarismo: “- É preciso impor limites a essas crianças!”. Ou ainda, em tom de crítica: “-Esses pais não colocam limites nessas crianças!”. Enfim, tudo parece estar associado ao “limite”: a obediência, a disciplina, a questão da  moral, o respeito aos outros, ao espaço físico e as regras.  Nesse caso, a palavra “limite”  tem um sentido metafórico.   Mas, afinal, qual o verdadeiro sentido dessa palavra tão utilizada   nos contextos escolares  e  familiares?
    Pode-se dizer que “Limite”,  é um convite para passar para o outro lado.  É exatamente isso. O verdadeiro sentido, a explicação morfológica da palavra,  remete-nos à idéia de fronteira, de linha que separa territórios ou ainda,  um determinado espaço físico.   É como se disséssemos: “Esse é o limite da minha casa”.  Significa dizer que além dela, há algo que não é  mais minha casa.  O espaço não mais me pertence.  Ultrapassá-lo, seria invadir o espaço do outro.   Isso quer dizer que, atingido um determinado limite, há coisas que não posso e, não devo mais fazer. É muito comum quando crianças, ouvirmos dos adultos: “ -Você não tem mais idade para isso, ou ainda: “-Isso é coisa de criançinha!.  É quando a criança percebe que há idade para realizar determinadas coisas.   É quando a criança percebe  que, a sua idade não mais permitirá  fazer uma grande quantidade de coisas  interessantes!.
     Então,  amadurecer,  pode soar como algo que não é tão bom!.  Concluí-se que o lado de lá do limite é negativo.  Que com o passar do  tempo certas  ações  não são  mais permitidas.  
    Penso que para as crianças não deve ser tão fácil entender isso.   É cobrado delas “coisas” que ainda não conhecem.  E muitas vezes o tom não é nada agradável!.    Simplesmente, “ “isso não é mais para você!”.   “O que você  está fazendo?”. Vem, o “Isso pode”. “Isso não pode e, pronto!”.     E essa brusca ruptura ocorre exatamente por volta dos  6 a 7 anos.    A criança precisa abandonar determinados brinquedos, o colo.  Está na hora de ir à Escola. Chorar, nem pensar!.  A  professora que até então,  permitia-se  ser chamada de “tia”, agora é “professora tal”.   Muitas vezes, nesse momento, na escola,  cria-se  uma “barreira” entre a “professora” e o “aluno”.   Na Educação Infantil, ela tinha horários para brincadeiras e, algumas atitudes eram permitidas.    Agora, não tem  mais parque; correr, nem pensar...   E ainda, alguns reforçam: “-  Acabou a “moleza!”.  Agora, você vai estudar de verdade!”.   A maioria das aulas são expositivas .   E  o  brincar?!. Nem pensar!.   A criança é exposta em fileiras, uma carteira  atrás da outra  e, recebe muitas responsabilidades.    Agora, ela será avaliada por “nota”.; Tem a “tal” da  “prova”, dos pontos positivos e negativos.     E,   “o  medo”  se  instala  na criança.   Concluo que a escola para ela deixa de ser um espaço agradável.
    Logo, deixar de ser  “criançinha”,  parece não ser nada bom. Significa perder uma série de regalias,  coisas boas,  como: colo, afagos, brincadeiras.   Em outras palavras, o que a criança mais escuta é “- agora, você precisa mostrar resultados!”.  “Chega de brincadeiras”. “Hora de estudar é hora de estudar...”.   E, essa forma de lidar com o novo, pode contribuir para que permaneçam  infantis.   Afinal,  crescer  pra quê?.
   A passagem do 5o. para a 6o. ano, é uma das  passagens mais difíceis da vida escolar da criança, comparado a entrada na adolescência.
   A escola cobra da família: “seu filho não tem limites!”.  E isso gera uma  grande dúvida  na cabeça dos pais.  “Mas, que limite é esse?.   “Onde errei?”.   A  palavra está sendo empregada dentro de um contexto que já não se sabe o seu significado.  “Não ter limites é ser mal-educado?.  É ser indisciplinado?!. 
   Acredito que seja também dessa forma que a criança sentirá a necessidade ou não de  conhecer o outro lado; de ultrapassar os limites físicos e aceitar os restritivos. Talvez por isso, há tanta resistência às regras, as leis nos espaços compartilhados. 
  Nessa passagem, os adultos ficam investidos de muito poder sobre a criança, e imaginam controlar os seus desejos, aquilo que devem fazer. De certo modo passam a acreditar que podem determinar o futuro de seus filhos e alunos por meio do chamado "controle dos estímulos".  Ocorrem aí decepções dos pais, dos educadores quando percebem que não têm o domínio sobre "o desejo" do outro, mesmo que esse outro seja seu filho(a). 
   A mobilização interna é desejo do próprio sujeito e, somente dessa forma o sujeito estará aberto  ao novo.  E, é  nessa trajetória que ele se desenvolve,  se humaniza,  se reconhece,  se mostra ao outro; mostra suas  inscrições, aptidões, e, escolhas.
  O quadro atual  demonstra  que os pais das gerações anteriores,  agiram por pura incompetência  no  exercício  de  educar.   E,  os pais da geração atual,   devido  a preocupação de ter de estabelecer “limites” sem ser radical, nem permissivo, acaba também, agindo  por pura  incompetência,   e,   têm falhado..  
     Talvez, o caminho seja encontrar a "justa medida" de que trata Aristóteles, filósofo grego. 
    Outra crença que a modernidade alimenta é que a criança não pode ser frustrada senão ficará traumatizada. Então devemos satisfazê-las sempre. Esse engano tem traumatizado pais e professores.
   A psicanálise postula que deve haver certa dose de insatisfação, de frustração para que o sujeito adquira uma boa estrutura psíquica -, para que a troca  de uma coisa por outra ocorra de forma consistente e espontânea.   
   Sabe-se  que  a  criação das  gerações anteriores foram radicais demais;  a  seguinte,  liberal demais.   E, dessa forma,  os pais da  geração atual,  buscam aprender;  conhecer o que há sobre as questões do desenvolvimento infantil; as causas e as consequências  de  uma  educação  falha.  
   Hoje há discussões e um consenso entre escola e família de que deve haver a sujeição desse excesso de liberdade na educação dos pequenos. A família deve apresentar desde cedo os limites restritivos à criança para que ela entenda que no meio social compartilhado nem tudo é possível e, que certos comportamentos não são permitidos.    
  Na maioria das vezes  a dificuldade só aparece na iniciação escolar por volta de 6 ou 7 anos.   Quando a criança começa a mostrar no meio social as suas “inscrições”, ou seja, a forma como ela se estruturou, - o que a família fez dela.      
  É preciso saber que as operações mentais não se constroem do nada, se movimenta dentro do que pode e  do que não  se pode fazer.    A criança se apropria da informação, do espaço que lhe foi dado, e  a inteligência vai se classificando, organizando as informações e, fazendo as acomodações, conforme Piaget.  Neste sentido, a criança  se apropria dos  objetos, das  informações e, os transformam; constrói suas ideias, o  conhecimento se estrutura.
   É certo que são os pais que devem estabelecer os limites restritivos; mostrar os percalços. Esses limites são um dos pilares para uma boa educação, pois fornecem aquele sentimento de segurança física; aquilo que a criança necessita para aprender as grandes lições de  autocontrole  e  de  comportamento  ético.
   Quanto se trata de “Limites”, muitas vezes a dúvida permeia a cabeça dos pais em relação ao que fazer e como lidar com os comportamentos indesejados apresentados pela criança na escola. Não ter limites é o mesmo que ser indisciplinado?
    Disciplina é outra palavra muito utilizada nos contextos escolares e familiares. Empregada também com frequência, em geral de forma queixosa.  Então,  cabe aqui defini-la.  Em sua origem, a palavra disciplina tem a ver com discípulo.  Discípulo é uma pessoa que tem alguém como modelo e, se entrega pelo valor que atribui a essa pessoa.  Esse  é  outro tema bastante difundido  nas discussões que envolvem crianças e jovens, também usado de forma indiscriminada.    Para o especialista em Disciplina, Lino de Macedo (2005), “Disciplina não é questão de boa  ou má conduta".   Disciplina se aprende, é uma competência escolar que as crianças aprendem como qualquer conteúdo. É uma disciplina interdisciplinar, porque dela dependem de todas as outras”.   Lino acredita que “o maior erro da escola é pensar que existe um único tipo de disciplina e que ela só pode ser imposta”.   Para  Macedo,  é possível ensinar disciplina  e, pode-se conquistar o aluno para um projeto de disciplina conseguindo por exemplo, a admiração dele.   E por outro lado,  afirma que “muita disciplina, controle obsessivo,  e  ordem podem prejudicar a criatividade das crianças”. E ainda, que “convencer é diferente de impor”. De fato, as pessoas costumam ouvir  mais  e  respeitar as pessoas a quem admiram.  Então, o caminho  é  encantar, conquistar as crianças, ganhar a admiração delas!
     Quanto à questão da “indisciplina” e do “limite’, sua falta e necessidade,  os adultos também carecem delas!.    Fala-se muito que as crianças de hoje não têm limites.  Mas, os adultos, também não têm.  Em uma sociedade capitalista como a nossa, da competitividade,  não se tem horários regulares para nada, nem mesmo para as refeições.   Logo,  os adultos não têm uma rotina regular para organizar a sua vida e nem mesmo a vida de seus filhos.    É justificável  essa “indisciplina”  por parte dos adultos, pois é entendido os motivos dessa irregularidade.   Mesmo assim, devemos cobrar e, esperar um comportamento regular por parte das crianças.
   É certo de que o adulto precisa estabelecer as regras e os limites e, mostrar  o que quer que a criança. E, isso só ocorre por meio dos bons exemplos.  Afinal, a criança em formação, segue modelos e, estando em formação, precisa da experiência do adulto para se organizar no meio social. 
    Sabe-se que é a própria relação entre as pessoas que promove o crescimento e, é por isso que  considerando a visão interacionista, acredito que “... O ato de educar é também essencialmente relacional e não individual.”; que a troca de experiência,  ideias,  pensamentos enriquecem  a  relação quer seja entre pais x filhos ou professor x aluno.   E que, assim como as crianças, os adultos precisam ser argumentativos o suficiente para conseguir delas uma disciplina voluntária, por exemplo. 
     Vejo que muitas vezes  pais e professores “impõem” o que quer que a criança faça,  sem justificar,  sem convencer de que  aquilo é  melhor, sem responder aos por quês.  Isso sim é traumático  e  torna qualquer relação desgastada.   É certo que algumas crianças atendem e, fazem sem argumentar  e outras,  veem carregadas  de “por quês? Há as que são mais argumentativas e, fazem mais barulho do que outras.   E esse "barulho" simplesmente, incomoda -, não é observado, investigado pelos responsáveis por ela. Perde-se a oportunidade de aproveitar o argumento para tornar a regra consistente para todos. Muitos desgastes e contratempos poderiam ser evitados nas relações escolares e familiares se o diálogo fosse praticado com mais frequência.
 Por isso, os adultos precisam ser tão argumentativos  quanto às crianças para garantir a transmissão de valores, respeito mútuo e, os  limites restritivos tão cobrados nos dias de hoje.    
 (Adaptação de Texto - Livro: Limites: Como lidar com os pequenos?. Maria Teixeira.—1ª. Ed. São Paulo: Edição do Autor, 2014. 
   https://clubedeautores.com.br/book/170717--Limites
www.psicopedagogamariateixeira.com.br

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